quinta-feira, 25 de junho de 2009

Conjugando desigualdade


Conjugando desigualdade


Nos é ensinado assim:

Eu sou a autoridade e com a minha pistola na mão digo que
Tu é vagabundo, pivete, semente do mal, fa-ve-la-do do caralho! Ele sim, tu tá veno?
Ele é trabalhador. Homem bom. Deu emprego pra muita gente ai, na eleição passada.
Nós somos cidadãos de bem. Guardiões da moral e da ordem. Não somos como vocês: baderneiros, barulhentos, dançadores de funk... Música do inferno.
“- Cabo Silva, pode levar esses merda ai tudo. São tudo bandido e acabo”.

O presente é indicativo da intolerância
Do preconceito radicado em nossa cultura
Num pretérito imperfeito da nossa história.
História que nos ensina a conjugar adjetivos
Malditos
De realidades que queremos
Mas que não sabemos
Ao certo
Como comutar
Ou não queremos... Não sei.
É que alguns de nós
Dos seres periféricos
Deixaram-se vender sem perceber
E apesar de crerem estar normativamente
Errada a forma como nos é imposto
O breviário das coisas dos nossos dias
Repetem em alta voz
O discurso alheio,
O do “cidadão de bem”;
Ainda que a estranheza dessa fala
Corroa-lhe por dentro.
O futuro do nosso presente
Apenas se tornará um simples
Presente perfeito
Composto, dentre outras coisas,
De igualdades de direitos
Quando, enfim,
Aprendermos a conjugar o verbo
Lutar!
Enquanto isso,
Qualquer divagar
Não passará mais que
Um suspirar poético de um pensar
Antigo e fresco
Do insistente querer de justiça.
Nada mais.



Adriana Kairos

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Exílio


Exílio



Sem suas mãos
Falta-me a estabilidade
Da paixão transpirada
Corrompida
Pela vastidão do amor
Negado pela burrice
Da distância

Meu travesseiro conhece
A escassez da longitude
De seus dedos.
Encharcado
Soluça comigo
Cúmplice mudo da dor.

Sem sua boca
Sinto-me sem voz
Sem motivo para o batom
Sufocada por uma canção
Omitida
Frágil segredo
Guardado para ti

Não há outra voz
Que me entorpeça
Outra qualquer
Só desalenta
Efêmera
Sadista
Plagiam a fantasia
Do desejo de ouvi-lo
Mais uma vez

Não há outro toque
Que me encante
Nem condão que me desperte
Se a tua pele tange
Meu corpo
Ávido
Desesperado
Por um veio que seja
De ti

Desamparei o orgulho
Para rogar que voltes
Abandonei a ilusão
De deslembrar-te.
Apenas uma convicção
Alenta-me
A crença de que
Também não me esqueceu.





Adriana Kairos

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Psicose


Psicose


A distância não tem ajudado
Sua imagem foi reforçada
Com a saudade
Essa é carrasco cruel
Sussurra em meus ouvidos
Sua voz
Acaricia minha pele
Como seus dedos
Mas não mata a sede
Dos meus desejos
Maldita saudade!

Vou voltar
Espere-me
Vou voltar

E enfim daremos vez
Ao amor
Porque eu te amo
E você sabe
Não acredite nesses loucos
Que me julgam sem razão
Nunca lhe fiz mal
Não é?
Apenas te amo
Malditos médicos!

Vou voltar
Não tenha medo
Vou voltar

Serás minha
Como antes foi
Mas nunca mais
Digas que não me ama
Isso me magoa
Não quero ferir-te outra vez.
Estou quase saindo daqui
Posso sentir
Viva ao amor!

Espere-me
Não tenha medo
Vou voltar.





Adriana Kairos

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Lapa



Lapa


Embriago-me da tua sede
Da força que me domina
Faço um forte
Para guardar-me
Em ti
Roubo-te o ar que respiras
Assim tenho em mim
Um pouco da vida sua
Da fúria tua
Do querer teu

Bocas em choques
Pele sob tensão
Curtos de desejos


Pesquei em copos boêmios
Palavras diferentes
Palavras em pedras raras
Para te ofertar
Encontrei algumas
Você nem viu
Nem as ouviu
Mas bebeu-me toda
Em copo de caipirinha
Pilando-me sem machucar

Cabelos em alvoroço
Pescoço
Mãos e dorso
Bailarinos
Os Arcos brilham ao luar.




Adriana Kairos

"Às vezes, tenho a impressão de que escrevo por simples curiosidade intensa. É que ao escrever, eu me dou as mais inesperadas surpresas. É na hora de escrever que muitas vezes fico consciente de coisas, das quais, sendo inconscientes, eu antes não sabia que sabia."

Clarice Lispector